O centro do Recife sempre foi mais do que um lugar
geográfico. É um coração que pulsa histórias, memórias e sonhos. Quem nunca
andou por aquelas ruas estreitas, sentiu o cheiro do café fresco vindo das
lanchonetes, perdeu tempo admirando vitrines cheias de vida? O centro é um
personagem vivo, cheio de personalidade. Carrega no corpo os traços de um
passado glorioso e a esperança de um futuro melhor.
UMA HISTÓRIA TECIDA POR MASCATES E MEMÓRIAS
O Recife sempre foi dos mascastes — os comerciantes
resilientes que fizeram do centro um mercado vivo e vibrante. Gente que cruzava
pontes, trazia sotaques e produtos de todos os cantos do estado. Cada esquina
conta uma história. Os prédios antigos sussurram segredos de um tempo onde tudo
parecia possível. O Cine São Luiz era um templo do cinema. Assistir a um filme
ali era mais do que lazer: era evento, encontro, ritual.
E como esquecer dos bares e restaurantes que marcaram época?
O Savoy, que ainda alcancei com meu pai e os amigos, o Dom Pedro, o Leite, o
Moscouzinho...ainda tinha o Buraco da Otília e os bares do Pátio de São Pedro, espaços onde se encontrava sabor, conversa e, por que não,
afeto. Templos da convivência. Por falar em convivência como não lembrar e
citar a Livro Sete: adorava ir lá passar o tempo entre corredores de livros e
cultura, também trazer pra memória os Teatros Valdemar de Oliveira, do Parque e
Santa Isabel e os cinemas Veneza, Ritz, Astor, Moderno. Lembrar das lojas de tecidos da Rua da Imperatriz, e Nova e Duque de
Caxias, das manifestações democráticas,
das festas que encheram aquelas ruas de sentido. A cidade era uma celebração.
ENTRE A DEGRADAÇÃO E A ESPERANÇA
Mas os tempos mudaram. E hoje, andar por certas partes do
centro também dói. Prédios esquecidos, teatro e cinemas fechados, lanchonetes
que viraram poeira e tapume. Há um sentimento de abandono, como se a cidade
estivesse esperando — paciente, resiliente — por um novo propósito.
E é aí que entra uma fagulha de esperança. O Recife, teimoso como só ele, decidiu reagir. A criação da secretaria Recentro, pela gestão do prefeito João Campos, é um passo importante e que seja pra transformar. Pela primeira vez em muito tempo, há um esforço concentrado para discutir, recuperar e redemocratizar o uso dos espaços centrais da cidade. E não se trata só de revitalizar fachadas — trata-se de devolver a alma ao lugar.
É possível ver mudanças: na Avenida Conde da Boa Vista, por
exemplo, entre o antigo Colégio Marista e a Agamenon Magalhães, surgem novos
comércios, escolas como o São José, a FAFIRE, a Unibra, empreendimentos que
voltam a dar vida a esse corredor histórico. Mas é preciso ir além. O poder
público tem o desafio de estender esse cuidado a outras vias fundamentais:
Guararapes, Duque de Caxias, Palma, Praia, Nova, Imperatriz, Sete de Setembro,
Hospício — mal parafraseando Alceu nas “pelas ruas que andei”.
A Avenida Dantas Barreto, por exemplo, tem projeto pra virar
um corredor da história e da cultura, o que pode puxar a requalificação de todo
o entorno. E não se pode esquecer das praças: Maciel Pinheiro, Independência e do Sebo, do Largo do Carmo e Parque 13 de Maio — espaços que precisam voltar a ser ocupados
com vida, arte, encontros.
Mas revitalizar o centro também passa por moradia. É preciso
pensar em habitação para diversos públicos, retrofit de edifícios, presença de
serviços públicos e equipamentos culturais. O centro precisa ser lugar de
viver, não só de passagem. E essa missão não é só da Prefeitura do Recife — o
Governo de Pernambuco precisa estar junto. O Recife é a capital mais antiga do
país. Carrega história nas veias – e nas vias.
O CENTRO, NOSSA CASA
O centro do Recife é nossa casa. É de quem trabalha, de quem
mora, de quem passa, de quem lembra. E, com cuidado, investimento e amor,
podemos devolver ao centro a vida que ele merece. Que voltem os risos nos
bares, o cheiro de café fresco nas ruas, a alegria dos cinemas, teatros,
mercados e vitrines.
Porque, no fundo, o centro do Recife é parte da alma da
cidade. E, como cantou Alceu, “pelas ruas que andei” ficou um pedaço de todos
nós, ficou muita coisa viva — e ainda pode voltar a florescer. Que a gente
nunca esqueça disso.
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