Não se pode deixar esquecer...

Tem um ponto no filme O Agente Secreto que me tocou bastante. Foi o esquecimento e não a lembrança do filho pelo pai. 

Quando Fernando, já adulto, diz que não tem memória do pai, assassinado pela ditadura, o filme de Kleber Mendonça Filho deixou de ser apenas cinema e virou espelho. Porque esquecer também é um gesto político. Às vezes de dor, às vezes de defesa.

Armando, vivido por Wagner Moura, é o homem que queria reconstruir o tempo que o regime lhe roubou. Queria o convívio com o filho, o cheiro da casa, o som da infância. Mas o que a ditadura leva, nem sempre devolve. 

O exílio da memória é mais cruel que o da geografia. O filho cresce sem lembrança, sem rosto, sem voz. E talvez esse vazio seja a única forma de continuar vivendo.

A cena me fez pensar no quanto o Brasil ainda tenta, a cada geração, costurar  sua própria história. Entre o medo e o esquecimento, seguimos tentando lembrar. Porque lembrar é resistir. É dizer que ninguém apaga o que foi vivido, mesmo quando a memória adormece.

Talvez o esquecimento de Fernando seja o modo íntimo de gritar. Um grito que não quer ferir, apenas se proteger. Mas, para nós, que assistimos, é um lembrete: esquecer é deixar que tudo volte. E a gente não pode deixar.

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